TJ/RS: Tribunal cassa parte de liminar que obrigava CEEE Equatorial a isolar redes elétricas para evitar choques em bugios
A 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) decidiu, por unanimidade, revogar parte da liminar que obrigava a CEEE Equatorial a isolar cabos e equipamentos da rede elétrica em locais com registros de acidentes envolvendo bugios-ruivos. Com a decisão, a companhia não é mais obrigada a adotar medidas de isolamento após cada ocorrência com os animais.
A liminar havia sido concedida em março de 2023, no âmbito de uma ação civil pública ajuizada pela Promotoria de Justiça do Meio Ambiente de Porto Alegre. A promotora Annelise Steigleder ingressou com a ação em fevereiro daquele ano, após a carcaça de um bugio permanecer pendurada por cinco dias na rede elétrica da Avenida Lami, no bairro Belém Novo, em Porto Alegre.
“Entramos com a ação para evitar novas mortes e garantir a preservação da espécie, que é uma das mais ameaçadas do mundo”, afirmou a promotora. Ela explica que a liminar determinava a elaboração de um plano de prevenção pela CEEE, incluindo poda de vegetação em contato com fios e o isolamento de cabos e conectores da rede elétrica.
Na mesma ação, o Ministério Público requer a condenação da empresa ao pagamento de R$ 1,55 milhão por danos ambientais, valor correspondente a 25 animais mortos e 15 feridos entre dezembro de 2021 e fevereiro de 2024. Segundo a promotora, os dados foram reunidos com base em registros de acidentes com bugios causados por choque elétrico.
“São mais de 40 mortes apenas na região sul de Porto Alegre nos últimos anos. E mais de 50% dos acidentes com bugios-ruivos ocorrem na rede de baixa tensão não isolada. É um risco constante”, declarou.
A CEEE recorreu ao TJ-RS e obteve decisão favorável. Conforme o voto do relator, desembargador Eduardo Delgado, a companhia passa a ter como obrigação apenas a poda de árvores nas áreas de ocorrência dos acidentes e o custeio do tratamento veterinário dos animais sobreviventes. Os custos médios apresentados no processo variam entre R$ 9 mil para o tratamento de queimaduras e até R$ 225 mil para casos de amputação e manutenção em cativeiro, considerando o tempo médio de vida da espécie, de 15 anos.
“É muito preocupante essa decisão. O isolamento dos cabos e conectores era a medida mais urgente. É como termos um fio desencapado na rua: o risco de morte é permanente”, afirmou Annelise Steigleder.
A decisão do TJ-RS também determinou o retorno do processo à 3ª Vara Cível de Porto Alegre e a inclusão do Estado do Rio Grande do Sul e da Prefeitura de Porto Alegre no debate sobre a proteção da espécie. Ambas as esferas de governo deverão participar de reuniões para discutir um plano preventivo definitivo antes da decisão de mérito.
Nota da CEEE Equatorial
Em nota, a CEEE Equatorial informou que suas atividades seguem as normas técnicas e ambientais em vigor, e que, em alguns trechos, a rede elétrica opera além dos padrões exigidos. A companhia declarou ainda que “o assunto não pode ser integral e adequadamente tratado sem a participação direta do poder público constitucionalmente responsável pela proteção da fauna”.
A empresa também apontou que o crescimento urbano na região sul de Porto Alegre exige políticas públicas que conciliem o desenvolvimento urbano e a preservação da fauna, e reiterou seu compromisso com a discussão do tema, destacando o diálogo mantido com o Ministério Público ao longo dos últimos dez meses.
Acidentes com bugios-ruivos (2018–2025)
Levantamento do projeto Macacos Urbanos, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), aponta os seguintes números de acidentes com bugios eletrocutados:
2018 — 4 choques, 3 óbitos
2019 — 2 choques, 0 óbitos
2020 — 9 choques, 5 óbitos
2021 — 8 choques, 3 óbitos
2022 — 17 choques, 9 óbitos
2023 — 19 choques, 11 óbitos
2024 — 24 choques, 16 óbitos
2025 (até o momento) — 15 choques, 9 óbitos
O bugio-ruivo é considerado uma das 25 espécies de primatas mais ameaçadas de extinção no mundo. A espécie vive majoritariamente em áreas entre a Reserva Biológica do Lami, em Porto Alegre, e o Parque Estadual de Itapuã, em Viamão. A fragmentação do habitat e a expansão urbana têm obrigado os animais a transitar por cabos elétricos ou por áreas urbanizadas, aumentando o risco de choques e ataques de cães.
“Nós lamentamos muito essa decisão. Mais de 50 % dos casos de acidentes com bugios-ruivos ocorrem na rede de baixa tensão não isolada. É um grande descaso com a fauna ameaçada do Rio Grande do Sul”, pontua a veterinária Itatiele Vivian, educadora ambiental do Macacos Urbanos.
Fonte: Zero Hora