Entrevista com David N. Cassuto

Professor Titular de Direito Ambiental da Pace Law School - Nova Iorque/EUA. Juiz de Direito em Nova Iorque/EUA. Diretor do Instituto Brasil-Estados Unidos de Direito e Meio Ambiente (BAILE), esforço de cooperação com a Fundação Getulio Vargas Escola de Direito do Rio de Janeiro (FGV/RJ) e Universidade Federal da Bahia (UFBA). Professor Visitante da Universidade Federal da Bahia e Fulbright Scholar na FGV Direito Rio (2010). Distinguished Visiting Professor de Direito Ambiental da Williams College/EUA. PhD em Literatura Americana pela Indiana University (1994), Juris Doctor em Direito pela Universidade da California Berkeley (1998). Atualmente, leciona nas áreas de property law, Direito Animal, Direito das Águas e Direito Ambiental Comparado Brasil/EUA. Conselheiro da Animal Legal Defense Fund (ALDF), fundador da Rede de discussão Animal Blawg (www.animalblawg.wordpress.com) e conselheiro da Revista Brasileira de Direito Animal. Tem palestrado em diversos países, tais como: China, Itália, Grécia, Coreia do Sul, França e Canadá, além de ter escrito para revistas de reconhecimento mundial como Harvard Environmental Law Review. David Cassuto concedeu uma entrevista exclusiva ao portal Jus Animalis.


Jus Animalis: Primeiramente, gostaríamos de agradecer imensamente ao senhor por ter gentilmente aceitado o convite para a entrevista ao Jus Animalis. O senhor tem uma grande atuação na área acadêmica referente ao Direito Animal, tendo ministrado aulas em diversos países do mundo, inclusive no Brasil. Em sua opinião, quais países se encontram mais avançados com relação à proteção dos animais não humanos?

David Cassuto: Muito obrigado pelo convite.  É uma honra.  Há muitos países no mundo que fizeram avanços significativos na proteção dos animais, mas, em minha opinião, ainda não chegamos a um ponto em que algum país deva ser destacado como tendo feito um trabalho bom o suficiente para ser comemorado.

Jus Animalis: E como o senhor enxerga a proteção dos direitos dos animais no Brasil?

David Cassuto: Acho maravilhoso o fato de o Brasil ter incluído a proteção animal no Art. 225 da Constituição, e acho que essa disposição é muito promissora para o avanço da proteção animal.  Acredito que, como a maioria dos outros países, o Brasil ainda está descobrindo se e como deseja atingir esse objetivo.

Jus Animalis: Em 2012, houve uma alteração da Secção 599 do Código Penal na Califórnia, motivada pelo caso “Associação de Carnes Nacional v. Harris” (2012), em que foram denunciados casos brutais de maus-tratos em abatedouros. Recentemente, para a surpresa dos defensores do bem-estar animal, a Suprema Corte dos EUA manteve a Proposição 12, da Califórnia, que, entre outras determinações, proíbe parcialmente a venda de carne suína de fazendas que mantêm porcas prenhes, em gaiolas de gestação. Apesar do bem-estar animal não ter sido o ponto principal para os juízes, e sim a capacidade dos estados americanos de estabelecer seus próprios padrões de produção de bens importados de outros estados, o senhor acredita que hoje a Proposição 12 é a lei de bem-estar dos animais de fazenda mais forte da América?

David Cassuto: Não sei se é o mais forte, mas certamente é um dos mais eficazes em termos do número de animais que afeta em todo o país.

Jus Animalis: Como o senhor vê a mudança no comportamento alimentar dos seres humanos, com o crescente número de adeptos da dieta vegana? O senhor acredita ser possível que um dia os animais não sejam mais usados ​​para alimentação?

David Cassuto: Os seres humanos têm se debatido sobre como e o que comer desde que andamos eretos, e não vejo isso mudando.  No entanto, parece que cada vez mais pessoas estão prestando mais atenção não apenas à qualidade nutritiva de seus alimentos, mas também à ética da criação desses alimentos.  À medida que mais pessoas examinarem criticamente tanto seus alimentos quanto suas motivações para consumi-los, acredito que elas se voltarão para dietas sustentáveis que não imponham crueldade desnecessária.

Jus Animalis: Infelizmente, o planeta Terra tem enfrentado intensas mudanças climáticas, afetando sobremaneira os animais e os seres humanos. Neste sentido, o senhor tem desenvolvido importantes trabalhos com relação à proteção dos recursos hídricos, e em especial, no Brasil, sobre o aquífero Guarani. Conte-nos um pouco sobre esse seu trabalho e sobre como o senhor enxerga a relação da sociedade brasileira com nossas riquezas naturais.

David Cassuto: O acesso à água sempre foi uma fonte de tensão entre países e civilizações. O Guarani oferece um excelente exemplo de um aquífero transfronteiriço sob crescente estresse, à medida que os suprimentos de água potável diminuem em face da perturbação climática e da expansão populacional.  Não me sinto qualificado para discutir a relação do Brasil com os recursos naturais.   No entanto, direi que o Brasil - como qualquer país grande com geografia variada - é uma nação diversificada, cujo povo tem muitos tipos diferentes de relacionamento com a terra, seus recursos e seus habitantes não humanos.

Jus Animalis: O senhor acredita que é possível reverter tantos estragos advindos do aquecimento global, a fim de garantir a sobrevivência das florestas, das espécies de animais e dos seres humanos? Se sim, quais ações seriam necessárias?

David Cassuto: Sinceramente, não acho que isso seja possível.  Acho que precisamos nos esforçar ao máximo para mitigar os danos já causados, evitar mais danos e fazer o melhor possível para tornar esse mundo o mais habitável possível para humanos e não humanos na nova era do Antropoceno. Isso envolverá o reconhecimento de que as necessidades e os desejos humanos não podem continuar a ser a prioridade dominante para o gerenciamento de ecossistemas.

Jus Animalis: Qual a sua visão para o futuro dos direitos da natureza e dos animais não humanos? O senhor acredita numa elevação real de seus status para sujeitos de direitos?

David Cassuto: Acredito que somos uma sociedade cada vez mais global, caminhando lenta, mas inevitavelmente, em direção a um regime de direitos mais abrangente para todos os habitantes do planeta.  Já vimos alguns movimentos dramáticos em muitos países.  É uma época empolgante para se viver, embora seja também uma época de terríveis atrocidades.  Tenho uma esperança cautelosa de que uma sociedade mais justa um dia tomará forma.


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