Outros animais: vítimas invisíveis de desastres naturais

Há mais de uma semana, uma tragédia atingiu a cidade argentina de Bahía Blanca. As imagens do desastre foram divulgadas em todo o mundo. Uma história em particular chamou minha atenção: Adrian Coccia retornou, em meio a uma chuva torrencial, à sua clínica veterinária para resgatar os cães e seus companheiros humanos presos lá.

Normalmente, quando há um desastre, vemos cães sendo explorados para resgatar vidas humanas, e alguns, como Wilson - o pastor alemão que foi abandonado depois de se perder nas selvas colombianas seguindo a trilha de crianças que sobreviveram a um acidente de avião - perdem a vida na tentativa. 

Mas o que acontece quando eles são as vítimas? Alguns, como os cães no consultório veterinário de Adrian, tiveram a sorte de serem resgatados em um ato heroico por esse veterinário, mas muitos outros morrem sem que saibamos realmente quantas vidas foram perdidas.

 A tragédia em Bahia Blanca deixou vítimas não humanas quando estávamos apenas tentando superar as imagens desoladoras dos incêndios entre Santa Monica e Malibu, na Califórnia, que transformaram 6.960 hectares em cinzas e destruíram as casas de milhares de famílias de várias espécies. Durante a noite, muitos ficaram desabrigados e tentaram encontrar seus fiéis companheiros, cães e gatos, em meio aos esforços dos socorristas que encontraram alguns e os colocaram em abrigos temporários, onde até mesmo atores famosos vieram confortar os cães e gatos feridos nos incêndios. Outros foram acolhidos por moradores famosos, como Paris Hilton, que tinha um filhote de cachorro em sua casa enquanto procuravam por sua família.

Tudo isso me fez pensar se, por exemplo, no município onde moro, estamos preparados para algo assim? Temos um protocolo de resgate para outros animais em caso de desastres como esse? Ou continuaremos a priorizar as vidas humanas e deixaremos de lado esses seres que abençoaram a vida das famílias multiespécies das quais fazem parte com sua presença? E os outros animais em situação de abandono, erroneamente chamados de “animais de rua”?

Esses eventos dolorosos, que envolvem a perda de vidas humanas e não humanas, devem nos ajudar a redesenhar os protocolos de reação voltados para o resgate de vidas humanas e não humanas e a oferecer abrigos, lares adotivos e a busca de pais adotivos para aqueles que não conseguem se reunir com suas famílias ou que as perderam nessas tragédias.

Por fim, este texto quer chamar a atenção para a necessidade de incorporar essas outras vítimas às políticas públicas, à prevenção de riscos e aos protocolos de resgate em meio a desastres naturais. Este pequeno texto também foi escrito com o objetivo de prestar uma simples e pequena homenagem a essas vítimas silenciosas e, às vezes, invisíveis dessas tragédias e agradecer àqueles que tentam salvar esses seres, independentemente do fato de não pertencerem à nossa espécie.

JOHANA FERNANDA SÁNCHEZ JARAMILLO

Johana Fernanda Sánchez Jaramillo, animal humano, mulher negra e sentimentalista. Doutora em Direito pela Universidad del Rosario na Colômbia, formada com excelência acadêmica. Advogada, comunicadora social e jornalista, mestre em relações internacionais, assistente social comunitária. Autora de 11 livros, oito relacionados ao conflito armado colombiano e três jurídicos, sendo estes: "A tensão entre o direito ao meio ambiente saudável e o desenvolvimento, na visão dos juízes" (2022); "Os animais como sujeitos de direitos: uma categoria jurídica em disputa" (2023) e "A declaração da natureza como sujeito de direitos e seu impacto na defesa de Katsa su do povo Awá de Nariño" (Colômbia) (2024). Pesquisadora e ativista acadêmica pelos direitos dos outros animais, da Mãe Terra, dos povos indígenas e dos direitos humanos. Autora de centenas de artigos jornalísticos, em inglês e espanhol, palestrante nacional e internacional. Vencedora de prestigiosas bolsas de jornalismo internacional, como Carter Center nos Estados Unidos, Justice for Journalists Foundation no Reino Unido e o International Center For Justice (ICFJ) nos Estados Unidos, dentre outras bolsas e reconhecimentos na Colômbia e na América Latina.

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Declaração Rioplatense sobre os Direitos Animais