Globalização, pandemia e o florescer de uma nova civilização

Pandemia e Covid-19

Segundo a Organização Mundial de Saúde - OMS, uma pandemia é a disseminação mundial de uma nova doença. O termo é utilizado quando uma epidemia - grande surto que afeta uma região - se espalha por diferentes continentes com transmissão de pessoa para pessoa.

Esta pandemia colocou em evidência a bioética. A bioética é uma disciplina interdisciplinar que traça princípios éticos e morais, utilizando conceitos da Biologia e do Direito relacionados com a conduta dos seres humanos em relação aos humanos e outras formas de vida, inclusive na medicina ou outras ciências.

O tema se tornou atual com o surgimento da chamada COVID-19. Este vírus misterioso surgiu na China. O primeiro alerta do governo chinês à Organização Mundial de Saúde – OMS sobre o vírus se deu em dezembro de 2019. Segundo relatos iniciais, tratava-se de uma pneumonia desconhecida que surgiu na cidade de Wuham. Foi identificado como um coronavírus que recebeu o nome o nome técnico Covid- 19. O Ministério da Saúde confirmou em 26 de fevereiro de 2019 o primeiro caso de coronavírus no Brasil. A origem da doença foi atribuída à contaminação vinda dos morcegos, que são hospedeiros naturais de diversos agentes infecciosos. E depois ao pangolin. A moléstia teria surgido com o consumo de carnes do animal no mercado de Wuhan.

Teorias da conspiração

Segundo cientistas chineses, o vírus pode ter passado dos animais para o homem em um mercado que vendia animais vivos em Wuhan. Mas a existência de um laboratório alimentou especulações de que foi ali que o vírus surgiu e escapou, como resultado de manipulações genéticas, acidentalmente ou não. O instituto abriga o Centro de Cultivo de Vírus, maior banco de vírus da Ásia, onde são preservadas mais de 1,5 mil variedades. Neste sentido, Luc Montaigne, descobridor do vírus da AIDS e prêmio Nobel de Medicina 2008, declarou acreditar que o vírus foi criado no laboratório durante a tentativa de produção de vacina contra a AIDS.

Da mesma opinião é a virologista chinesa Li Ming Yan. Ela é uma pesquisadora chinesa formada em medicina, com doutorado e especialização em imunologia e virologia. Ela declarou que o SARS- COV-2 foi intencionalmente desenvolvido em laboratório. Ela afirma que suas tentativas de alertar a comunidade científica sobre os perigos do vírus foram silenciadas pelo governo chinês. Posteriormente, a pesquisadora se refugiou nos EUA alegando perseguição. Suas alegações foram publicadas em 14 de setembro de 2020 em um artigo não revisado por seus pares, escrito em coautoria com outros três pesquisadores, gerando repercussão na comunidade científica. 

Mercado chinês, tráfico de animais e medicina exótica 

A China, além de consumir carne de vários animais e insetos, é responsável por saquear os países africanos e asiáticos, e comercializar animais para o comércio da medicina exótica, principalmente onde a caça é liberada. O comércio de afrodisíacos e outras drogas inclui vísceras e partes de animais, como chifres de rinoceronte, de veados, vértebras de tigres, testículos de focas, sangue de cobra, bílis de urso, insetos e outros provenientes do massacre da fauna.

Seres sensíveis como os ursos, passam a vida aprisionados em lúgubres masmorras para ter extraída a bílis de sua vesícula para suposta cura de problemas no estômago, fígado e até câncer. Rinocerontes têm seus chifres arrancados para fabricação de remédio para curar febre, epilepsia e outras doenças. Ossos e pênis de animais são vendidos como afrodisíacos. Partes de tigre de bengala são transformadas em poções, assim como a cobra, de cujo sangue se produz vinho e bálsamos.

No nordeste do Brasil, muitos animais são utilizados para fabricação de remédios para vários fins e o olho de boto é usado como talismã.

Outras pandemias

Outras pandemias inesquecíveis foram a peste negra e a gripe espanhola. A peste negra, conhecida como peste bubônica, é uma doença causada pela bactéria Yersinia pestis e que atingiu o continente europeu em meados do século XIV. Existem inúmeras teorias sobre o lugar específico onde a doença surgiu, mas a mais aceita sugere que o lugar de origem é a China e que, durante muito tempo, a peste tenha atuado exclusivamente na Ásia Central. A partir do século XIV, ela se espalhou por terra e por mar pelo Oriente. A doença teve contato com os europeus por meio de um conflito que aconteceu em Caffa, colônia genovesa localizada na Crimeia (região atualmente disputada por Ucrânia e Rússia). As estimativas mais tradicionais falam que cerca de 1/3 da população europeia morreu por causa da crise de peste negra. 

A gripe espanhola foi o nome que recebeu uma pandemia de vírus influenza que se espalhou pelo mundo entre 1918 e 1919. Ninguém sabe exatamente de onde veio, mas o vírus influenza não se originou em seres humanos. Uma hipótese é que teria se originado a partir de alguma gripe de aves aquáticas e migratórias e esse vírus começou a nos atormentar há mais de 2000 anos. 

Um vírus aviário pode infectar um indivíduo, mas só consegue ser transmitido entre pessoas se sofrer mutação, ou no caso de encontrar um intermediário, os porcos, por exemplo. Embora conhecida como gripe espanhola ou bailarina da morte, não teve origem na Espanha. A Espanha foi o país que mais noticiou a pandemia, então acabou dando nome ao vírus. Segundo o historiador John Barry, uma teoria mais aceita é que a peste atingiu os EEUU em 1018, quando um hospital do quartel, Camp Fuston, situado dentro da base militar de Fort Riley, recebeu soldados infectados vindos de um vilarejo onde havia criação de gado.

Em 8 de agosto de 1967, o alemão Klaus F., tratador dos animais do laboratório Behring - Werke em Marburg, foi acometido de um misterioso vírus e morreu em duas semanas. Em 21 de agosto de 1967, Heinrich P., ajudante de vivissecção e executor dos animais, acusou os mesmos sintomas. E em 28 de agosto do mesmo ano, foi a vez da assistente de laboratório Renate R. Ao final, 31 empregados de Behring - Werke adoeceram e 7 dentre eles morreram. O vírus desconhecido foi chamado de Vírus Marburg, nome da pequena cidade que sediava o laboratório, e desconfia-se que veio dos macacos importados de Uganda. Os animais em questão estavam munidos de certificado de saúde fornecido por autoridades veterinárias de Entebe e foram devidamente examinados por veterinários na sua chegada a Dusseldorf. O laboratório Behring - Werke fabrica vacina anti-polio cultivando o vírus vacinal nos rins de macacos. O mesmo vírus apareceu em 1967 na Iugoslávia, em um laboratório de Belgrado, mas ignoram-se as consequências do fato.

Nove anos depois, em 1976, uma epidemia de vírus desconhecido, mas com efeitos similares ao de Marburg, eclodiu no Sudão, matando 284 pessoas. Dois meses depois, vírus análogo surgiu no Zaire, infectando 318 pessoas e matando 88% delas. Como a moléstia se deu perto do Rio Ebola, um afluente do Congo, o novo vírus foi batizado de Ebola. Em 1979. Ebola se manifestou de novo no sul do Sudão, matando 34 pessoas. Em 1995, o Ebola volta a abater o Zaire, fazendo 153 vítimas entre janeiro e maio, num total de 205 casos.

O Ebola apareceu, ainda, no laboratório militar Fort Detrick, em Maryland (USA), que oficialmente utiliza as cobaias animais e humanos para proteger os soldados contra a arma biológica e, oficialmente, produz armas biológicas e vírus mortais para serem usados nas guerras. Em 1981, segundo documentos do Ministério de Defesa americano, diversos litros do vírus Chikungunya desapareceram dos refrigeradores de Fort Detrick.

Foi em 4 de outubro de 1989, ironicamente no dia em que se comemora o Dia Internacional dos Animais, que a firma comerciante de animais de laboratório Hazleton Research Products recebeu um carregamento de 100 macacos proveniente do fornecedor filipino Ferlite Farms, com sede em Manilha. Os animais começaram a morrer semanas depois. Os animais mortos foram enviados a Fort Detrick para autópsia e foi detectada a febre hemorrágica e suspeita de Ebola. O laudo observava que os caninos dos macacos não foram lixados para evitar contaminação com mordidas, ocasião em que se descobriu que os animais sofriam mais esta agressão habitualmente. O edifício foi evacuado, o ar refrigerado estragou e ninguém queria entrar no recinto com medo da contaminação. Então, os animais sobreviventes ficaram encerrados nas jaulas, abandonados à própria sorte, em temperatura tórrida e no meio de suas fezes, esperando a morte num mar de sangue.

Um dos primeiros casos de doença viral contraída em laboratório de vivissecção remonta a 1898, quando um tratador de animais de laboratório foi acometido de uma infecção pulmonar através de contato com porcos da Índia submetidos à experimentação.

Outro fator que contribui para as pandemias pode ser o desmatamento. O desmatamento destrói o ecossistema e obriga os animais a viverem de forma anormal e estressante. A caça ilegal reduz a fauna e, com todos esses fatores, o vírus encontra terreno favorável para sua propagação. 

Conclusão

As endemias e pandemias surgem, sobretudo, devido à maneira como o ser humano se relaciona com os animais e a natureza.

Enquanto crescem as evidências científicas da origem natural do vírus COVID-19, estudos sugerem que teorias da conspiração podem tornar as pessoas mais propensas a ignorar as evidências científicas e menos propensas a acreditar que ações preventivas são necessárias. E não procuram melhorar seus hábitos ou adquirir comportamentos éticos em relação ao meio ambiente.

Para evitarmos novas pandemias, temos que mudar nosso relacionamento com os animais não humanos e a maneira como exploramos o meio ambiente. As mesmas ações que estão causando extinção das espécies, perda de habitat e mudanças climáticas, também provocarão futuras pandemias, afirmam os cientistas. Somente a mudança de comportamento do homem e a proteção do meio ambiente e dos animais poderão evitar futuras pandemias.

Já ficou demonstrado à sobeja que o desmatamento é um dos principais vilões no surgimento de doenças emergentes e pandemias. A este fenômeno denominaram a síndrome da floresta vazia. Cientistas alertam há décadas para o risco de novas doenças como consequência da destruição de florestas. As doenças zoonóticas se originam nos micróbios que das florestas estão migrando para os centros urbanos.

Muitas mudanças serão necessárias, como mudança nas políticas públicas, leis mais rigorosas para proteger o meio ambiente e a conscientização da população. A população precisa assumir sua responsabilidade junto ao setor produtivo e o Poder Público. Uma mudança de hábitos, mudanças alimentares, e de higiene será de grande importância para estancarmos a pandemia que se avança e para nos devolver uma vida saudável. Tornou-se urgente rever a prática da vivissecção e nossos hábitos alimentares.


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EDNA CARDOZO DIAS E TAGORE TRAJANO DE ALMEIDA SILVA

Edna Cardozo Dias é Pós-doutoranda pela UFBA. Doutora em Direito pela UFMG. Consultora jurídica e ex-professora Universitária. É especializada em Direito Público, Ambiental e Animal. Autora da primeira tese de doutorado sobre Direito Animal no Brasil, e primeira jurista a lecionar a cadeira Direito Animal no Brasil. Ao lado da carreira técnica atuou no terceiro setor na causa animalista e foi presidente fundadora da Liga de Prevenção da Crueldade contra o Animal. Presidiu o Instituto Abolicionista Animal - IAA. Foi fundadora e Presidente da Comissão dos Direitos dos Animais na OAB/MG, bem como da Comissão de Direito Urbanístico. Autora de vários livros e artigos, foi uma das articuladoras da inclusão do Direito Animal na Constituição da República e liderou as ações para criminalização dos maus-tratos aos animais.

Tagore Trajano de Almeida Silva é Pós-doutor em Direito pela Pace Law School, New York/USA. Doutor e Mestre em Direito Público pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) com estágio sanduíche como Visiting Scholar na Michigan State University (MSU/USA). Professor Efetivo Adjunto "A" da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia. Pesquisador Visitante da University of Science and Technology of China (USTC/China). Professor Visitante da Pace Law School, Williams College e Lewis & Clark Law School. Professor da Pós-graduação lato sensu em Direito Ambiental da Universidade Federal da Bahia - Fundação Faculdade de Direito. Professor do II Posgrado Internacional sobre "Derechos de los Animales y Sociedad Ética del Siglo XXI - Facultad de Derecho - UNNE - Corrientes – Argentina. Coeditor da Revista Brasileira de Direito Animal. Membro-fundador da Asociación Latinoamericana de Derecho Ambiental. Membro da Comissão de Meio Ambiente da Ordem dos Advogados do Brasil/Bahia. Advogado.

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