TJ/SP: Justiça proíbe que centro espírita expulse gatos comunitários por risco de maus-tratos
A Justiça de Campinas determinou que o centro espírita Casa de Jesus — Os Seareiros mantenha no terreno a colônia de gatos comunitários que vive no local e assegure a entrada diária de Kátia Maria da Silva Spagnol, de 73 anos, responsável por alimentar e acompanhar os animais há aproximadamente três décadas.
A liminar, assinada pelo juiz Guilherme Souza Lima Azevedo em 19 de novembro, proíbe a remoção de casinhas, tigelas, abrigos improvisados ou qualquer estrutura destinada ao bem-estar dos felinos, bem como qualquer impedimento ao acesso da cuidadora. A instituição foi notificada e tem prazo de 15 dias para apresentar contestação. O descumprimento da decisão pode gerar multa diária.
Instituição alega surpresa com a ação
Em nota, a Casa de Jesus afirmou ter sido “surpreendida” pela medida judicial, alegando que as tratativas sobre a presença dos gatos vinham ocorrendo “de forma cordial”. A direção sustentou ainda que houve deturpação dos fatos e que as preocupações envolveriam questões sanitárias, afirmando que a instituição “sempre foi favorável à causa animal”.
Restrição à alimentação e pedido de retirada das casinhas
Segundo a advogada de direitos animais Angélica Soares, em setembro de 2025 a atual administração passou a restringir a alimentação dos animais e solicitou a retirada das casinhas, sob a justificativa de incompatibilidade com o espaço. A cuidadora Kátia relata que lhe foi sugerido levar os gatos para uma praça pública sem estrutura adequada, local onde já teriam ocorrido episódios de envenenamento e descarte irregular de lixo — cenário que colocaria os felinos em risco.
Fundamentos da decisão
O magistrado destacou que interromper a alimentação ou remover os animais sem um plano de manejo seguro poderia configurar maus-tratos. A decisão faz referência ao artigo 225 da Constituição Federal, que impõe dever de proteção ao meio ambiente e aos animais, tanto ao poder público quanto à coletividade.
Três décadas de cuidado
Kátia conta que, por cerca de 30 anos, sai de sua casa no Jardim Planalto diariamente às 6h para alimentar e acompanhar os gatos. “Troco a água, ponho ração, coloco leite, sachê. Eles são o ar que eu respiro”, relata.
Ao longo dos anos, a colônia chegou a ter cerca de 80 animais. A fundadora da instituição, Sílvia Pascoal, já falecida, apoiava o cuidado com doações de ração. O chefe de manutenção do centro espírita chegou, inclusive, a construir um pequeno abrigo de alvenaria para os felinos na área externa.
Nos últimos quatro anos, voluntárias que formaram o projeto Mundo Felino passaram a auxiliar com castrações e atendimento veterinário, reduzindo o grupo para aproximadamente 15 gatos atualmente.
Divergências após mudança na administração
A advogada Angélica Soares afirma que o conflito se intensificou após a posse do novo presidente da instituição, que teria manifestado a intenção de retirar os animais. Segundo ela, a cuidadora e representantes do centro participaram de três reuniões em busca de um consenso, mas sem sucesso — o que levou Kátia a ingressar com a ação judicial.
Nota da Casa de Jesus
A Casa de Jesus — Os Seareiros divulgou nota extensa ressaltando seu histórico de atividades espirituais, educacionais e assistenciais, além da existência, desde 2016, de um programa de atendimento espiritual a animais (TEA). A instituição afirma que sempre buscou conciliar questões sanitárias com a presença da colônia e reforça que prestará esclarecimentos no processo.
Processo n. 4017617-77.2025.8.26.0114
Fonte: G1